domingo, 9 de julho de 2017

[OPINIÃO] Como foi narrar o V5 pre-alpha playtest

No dia 08/07/17 eu tive o prazer de testar o pré-alfa da quinta edição de Vampiro a Máscara no Dungeon Geek Weekend Edition, em São Paulo. Este artigo não tem a intenção de ser uma resenha, e sim de expressar as minhas impressões como narradora de Vampiro, enfatizando as diferenças entre narrar essa edição e as precedentes (Revisada, V20 e Leis da Noite). Como ainda há poucas definições sobre o cenário, e para não gerar spoilers para quem ainda vai jogar a aventura do playtest, vou me ater ao sistema.





A seguir, vou listar as principais diferenças de regras entre esse pre-alfa e as edições anteriores, e explicar como isso impactou o andamento do jogo.

- Só três atributos, com especializações que refletem os 9 atributos anteriores: 
Essa foi uma diferença que eu senti que no começo incomodou ou confundiu um pouco os jogadores. Eu estou familiarizada e acostumada com sistemas simples, que reduzem ao máximo os atributos. Inclusive essa divisão já existia no sistema para Live Action Leis da Noite, desde a Edição Revisada de Vampiro.
Durante o jogo, a existência de atributos fluiu bem, e pareceu adequada para mim. Pareceu lógico, e melhorou a fluidez das rolagens, pois os jogadores acabam decorando quanto eles tem em cada atributo e isso é uma vantagem na hora de compor a parada de dados. Após o jogo, um dos jogadores confessou que preferia o sistema com 9 atributos porque, para ele, isso refletia melhor personagens muito bons em um atributo mas medíocres no outro da mesma categoria. Sinceramente, eu gostei dos três atributos com especialização. Nesse novo sistema, um dado a mais pode fazer TODA a diferença.

- Valor fixo no dado para somar um sucesso, fim dos efeitos especiais de resultados 1 e 10
Como agora todo valor 6 ou mais conta como um sucesso e o jogador só tem de contar os sucessos para ver se atingiu o número alvo (quantidade de sucessos necessária para ser bem sucedido numa tarefa), sem se preocupar com demais complicações, a rolagem de dados é muito ágil.
Não existe mais a falha crítica, mas não ter tido 6+ em dado nenhum funciona exatamente como a antiga falha crítica, com resultados muito ruins. Então o clima de tensão em cada rolagem está preservado.

- Virtudes e Vícios:
Durante o playest não houve muito tempo de explorar isso, mas foi possível notar que isso é bem dinâmico e força o jogador a interpretar seu personagem da forma como o mesmo está inserido na ficha, uma vez que, como veremos adiante, Força de Vontade vai só até 5 e recuperá-la é muito importante.

- Força de Vontade:
Na minha opinião, a Força de Vontade agora se tornou uma característica essencial do personagem. Com a possibilidade de gastar Força de Vontade para rolar novamente dados de um teste que não resultaram em sucesso, o jogador não corre o risco de ficar com um segundo resultado em rolagem pior que o anterior. A Força de Vontade pode realmente levar a um resultado melhor, sem o risco das coisas ficarem piores.
Por outro lado, o jogador tem de gerenciar bem esses pontos, já que o valor máximo é 5 e a qualquer momento ele pode precisar da parada de dados atual de Força de Vontade para resistir a situações extremas, e ficar sem Força de Vontade torna o personagem indefeso contra essas situações. Então o gerenciamento da Força de Vontade gera um estado mental de insegurança no Jogador que remete o mesmo à insegurança que o seu personagem está sentindo com relação às coisas que caminham pela noite e podem ameaçá-lo.

- Regras de combate em geral (iniciativa como valor fixo, dano fixo sem absorção, níveis de vitalidade, etc.)
Isso tornou o combate mais dinâmico, letal e assustador. Também acabou com aquele problema de ser muito bem sucedido em testes de ataque, com muitos dados adicionais para acrescentar ao dano, e ter uma rolagem péssima de dano. Ser atingido machuca e isso faz os personagens pensarem em se vale ou não a pena entrar em combate. Não depende tanto mais de sorte, e sim do quanto o personagem é bom em combate e quanto dano ele pode receber antes de ter sérios problemas.

- Pegar a Metade
Essa é a regra onde o narrador, ao invés de fazer uma rolagem resistida contra a rolagem do jogador, pega a metade dos dados do npc como dificuldade do teste. Para mim que estou acostumada a narrar Numenera essa regra caiu como uma luva. Houve momentos em que eu revelei a dificuldade, e em outros eu simplesmente disse se a ação do personagem foi bem sucedida ou não. Acredito que existam narradores e jogadores que prefiram uma ou outra abordagem, e recomendo observar com qual delas seu jogador fica mais ansioso e/ou motivado, para incitar a emoção mais adequada durante o conflito

- Alterações nas Disciplinas Físicas
Infelizmente, a aventura de playtest não permitiu testar as alterações nas Disciplinas físicas. Mas de tudo o que eu pude observar durante o jogo, tenho a impressão que essas alterações vão se encaixar como uma luva ao novo sistema. Não vou me estender para não ser injusto, afinal não é algo que eu vi acontecer.


- Sangue, Fome e Compulsões
Ah, essas regras. Essas regras são aquilo que eu sempre quis ver em Vampiro. Elas trazem de volta, como um tapa na cara do jogador, na forma de um SISTEMA integrado ao CENÁRIO, toda a sensação da Besta e da Fome que a maioria dos jogadores negligenciava nas edições anteriores. Não tem mais como fugir. A Fome está lá, ameaçando cada ação do Vampiro. A cada rolagem de dados ele sente os sussurros da Besta e a Fome crescendo. A angústia de ser um Vampiro, a Maldição, está em cada rolagem de dados. Isso se soma às outras mudanças no sistema para criar um estado emocional no jogador semelhante àquele que seu personagem está sentindo.
O gerenciamento da quantidade de vezes que o Sangue foi Despertado (ou incitado, use a palavra que preferir) pode facilmente se tornar o maior pesadelo do sistema. Mas eu burlei isso criando blocos de cartões com números grandes, para serem manipulados pelo próprio jogador. Assim, os dois valores estão lá assombrando o jogador e avisando o narrador o tempo todo. A coisa fluiu naturalmente, sem nenhum contratempo, e sem ter de parar o jogo para fazer anotações ou consultar quantidades. . Copie a ideia se achou legal.



- Considerações finais

Eu já narrei MUITO Vampiro. Foram mesas e lives, one shots e campanhas. Vampiro é o jogo do meu coração. Mas também é o jogo que me trouxe mais angústias e frustrações. E isso por causa de jogadores que ignoram a Besta e a Fome para tornar seus Vampiros máquinas de matar ou predadores sociais supremos e perfeitos, sem medo, sem defeitos.

Mas olha só: o novo sistema de Vampiro a Máscara é um tapa na cara do jogador a cada rolagem! O jogador está vendo que toda vez que ele rolar os dados para uma ação, sua fome estará ali atrapalhando. O jogador está vendo que cada vez que ele Despertar o Sangue ele pode fazer sua fome aumentar. Isso ficou evidente no jogo. Os jogadores agiram com cautela, sem abusos. Só Despertaram o Sangue quando realmente era necessário. Só fizeram rolagens quando não tinha outra saída. Um jogador que ignore a Fome não vai conseguir fazer isso por muito tempo. O sistema não deixa!

Há jogadores que afirmam que um bom sistema de RPG é aquele que é realista. Há outros que preferem os sistemas ágeis. Para mim, um bom sistema é aquele que se integra ao Cenário e cria o estado emocional adequado nos jogadores, para que isso se reflita numa experiência imersiva do que os seus personagens estão sentindo. E nisso, as regras desse playtest foram simplesmente magistrais. O sistema funcionou redondinho e muito coerente dentro da proposta do jogo.

O V5 me trouxe de volta o prazer de narrar Vampiro a Máscara, que há muito tempo eu havia perdido. Ele resgatou a essência do jogo. E é só um playtest. Estou ansiosa pela quinta edição.

Obrigada aos jogadores que participaram comigo desse playtest.

Graci


14 comentários:

  1. Parabéns pelo texto. Você apresentou de uma forma concisa e clara pontos importantes ao design, mesclando conhecimento técnico à experiência na mesa de jogo. Um tipo de crítica que considero bastante relevante.

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  2. Gostei do texto, ficou muito bom, admito que fiquei um pouco preocupado com a compulsão da fome, onde cada clã tem uma especifica, se isso não ia padronizar a interpretação, o que você sentiu no jogo?

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    1. Não caiu compulsão de clã durante o playtest. Mas eu não acho que isso vá padronizar a interpretação, e sim trazer a tona traços comuns às particularidades de cada clã que os jogadores normalmente negligenciam. As compulsões são momentos onde o Vampiro perde a razão por causa da fome, e portanto eu considero natural que hajam esses momentos onde o sangue, a herança de clã, fale mais forte. E mas interessante ainda que sejam claramente momentos de insanidade temporária, assim fica mais claro que o Vampiro não tem o controle sobre sua "vida".

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  3. Oie...
    Olha, um Hugo... É, então....
    Estava esperando as suas considerações sobre o V5. Sempre me norteiam com o crivo lógico que confio. Vlw!

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  4. Curti! legal a ideia dos cartões também

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    1. ^^ espero que seja útil. Funcionou muito bem no meu playtest

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  5. Você usou os polêmicos personagens do Alpha ou fez novos?

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    1. Usei os personagens da aventura, e eles são perfeitos para ela.

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  6. Ótimo texto! Precisa dar umas aulas pro carinha do RedeRPG que fez resenha do jogo-que-nem-foi-lançado usando versão alfa-test como parâmetro! Hahaha! :-P

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    1. Hahahaha não tenho nada a ver com isso, cada um com o nível de qualidade que acha que seu site tem de ter

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  7. Sua conclusão contem a melhor definição do que é um bom sistema de RPG, indo além do "o importante é se divertir" que ouvi em mais de 24 anos no RPG. Boa observações, e corroboro a sua opinião, me fez olhar novamente para o Storyteller (e querer comprar novamente). Estou ansioso por ver agora a regra de "Fúria" (Lobisomem) e a de "Paradoxo" (Mago), com toda certeza se for nesse padrão adquiriria os três volumes...

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